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GLAUCO DINIZ DUARTE  Energia solar como aliada da agricultura

Desde os primeiros dias do novo ano, o sol assumiu uma função extra na propriedade da família de Nelci Fernandes de Vargas, em Pinhal da Serra, próximo à divisa com Santa Catarina. Com 16 painéis fotovoltaicos instalados sobre a casa, o produtor espera se tornar autossustentável no consumo de energia elétrica nos próximos anos. A intenção é reduzir os custos com eletricidade nos 42 hectares destinados à criação de gado de corte e de ovinos e à produção de soja e milho.

Hoje, a conta de luz para a operação das câmaras frias, resfriadores e outros equipamentos instalados na propriedade chega a R$ 500 mensais. Com o investimento de R$ 37 mil, financiado pelo Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), o produtor espera zerar a despesa e ainda gerar excedente para suprir futuros consumos.

– Queremos instalar irrigação na lavoura e a energia solar poderá ajudar – projeta Vargas, que foi motivado a investir na tecnologia pelo filho Márcio Aurélio Rubert de Vargas, que mora na propriedade e é diretor da Sul Energia, empresa de energia fotovoltaica, que instalou os equipamentos.

Com capacidade para gerar 6 mil quilowatts hora por ano, quantidade superior ao consumo atual da propriedade, a família estima que o sistema de energia fotovoltaica se pagará em cinco anos. O cálculo de retorno do investimento foi feito também pelo produtor Dionel Augusto Funk, de Vale do Sol, no Vale do Rio Pardo. Com produção de fumo, soja e milho em 36 hectares, o produtor aguarda liberação de financiamento do Pronaf para investir em 125 placas fotovoltaicas que poderão gerar 48 mil quilowatts hora por ano.

A ideia é abastecer as estufas elétricas do forno de fumo e o secador de grãos. Por mês, as despesas com energia elétrica superam R$ 1,6 mil.

– O preço da energia disparou. Estamos buscando alternativas para aumentar a eficiência da propriedade – conta Funk, que contou com apoio da Emater na elaboração do projeto de financiamento de R$ 165 mil, com pagamento em 10 anos.

Embora crescente nos últimos anos, os investimentos em energia fotovoltaica no meio rural ainda são incipientes. O agronegócio responde por menos de 2% dos sistemas instalados no país, segundo a Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar).

A baixa participação é justificada pelo alto valor do investimento, com retorno a médio e longo prazos, e também pela falta de informação sobre o sistema.

– A tecnologia ainda não deslanchou no campo por desconhecimento do retorno. Mas, à medida que se disseminam os benefícios, o interesse dos produtores vem crescendo – diz José Claudio Secchi Motta, assistente técnico regional de Recursos Naturais da Emater.

Aplicações na propriedade

A energia solar na agricultura tem aplicações diversas, vai de bombeamento para irrigação, resfriadores para produção leiteira a cercas elétricas para manejo de gado.

– A agricultura representa um potencial enorme para o mercado de energia fotovoltaica no país – analisa Rodrigo Sauaia, presidente da Absolar.

Além do conhecimento da tecnologia, o crescimento do mercado depende de mais opções de crédito, diz Sauaia. Desde o começo do ano passado, o Pronaf passou a financiar a tecnologia para agricultores familiares. Em outubro, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) colocou a energia solar entre as prioridades das políticas voltadas ao setor primário, prometendo alongar de cinco anos para 10 anos o prazo de financiamento dentro do Finame.

– A carga tributária sobre os equipamentos ainda é muito elevada, passando de 40% – considera Sauaia.

Vinícola economiza até 90% em energia

Quem visita a moderna Vinícola Guatambu, em Dom Pedrito, na Campanha, depara com um parque solar com 600 placas fotovoltaicas. Desde maio do ano passado, o sistema instalado sobre o estacionamento passou a abastecer a empresa e vem surpreendendo pelos resultados.

Em sete meses, incluindo todo o inverno, o sistema gerou 125 mil quilowatts hora – média de 17,8 mil quilowatts hora por mês. A quantidade supera de longe o consumo médio mensal da vinícola, gerando excedente para abastecer outras atividades na propriedade.

– Passamos a aproveitar também a energia gerada no bombeamento da irrigação e nos secadores de grãos – conta Valter Pötter, sócio-diretor da Guatambu, que fez testes pilotos durante dois anos e meio.

Investimento deverá ser pago em até 10 anos

Desde a instalação do sistema fotovoltaico, a vinícola reduziu em 90% o gasto com eletricidade, que era de aproximadamente R$ 15 mil mensais. A redução só não chega a 100% devido à necessidade de pagar uma taxa mínima à concessionária para garantir corrente elétrica nos períodos em que os inversores não geram energia – à noite e nos dias de chuva. E se até no inverno o sistema não deixou a desejar, a expectativa para o verão é ainda maior.

– Certamente deveremos bater a marca de mil quilowatts diários agora em janeiro e fevereiro, quantidade necessária para abastecer o consumo da vinícola nos dias de maior demanda – comemora Pötter.

Pelos resultados até agora, o investimento de R$ 1,52 milhão (70% de capital próprio) deve se pagar em, no máximo, 10 anos. O entusiasmo é justificado também pela baixa manutenção dos equipamentos, fabricados na Europa.

– É um investimento que trabalha sozinho, só depende de sol, e ainda contribui para a sustentabilidade ambiental – diz Pötter, que já planeja ampliar a quantidade de módulos fotovoltaicos para suprir o sistema de irrigação e silos instalados na lavoura de grãos da propriedade.

Placas e estruturas ficaram mais baratas

O sistema fotovoltaico ficou 80% mais barato no Brasil no últimos 10 anos, segundo a Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar). À medida que o preço continuar caindo, os investimentos no setor tendem a ganhar mais robustez.

– Com o crescimento do número de fabricantes nacionais, os produtos devem ficar ainda mais baratos nos próximos anos – projeta o presidente da entidade, Rodrigo Sauaia.

Hoje, existem quase 30 fabricantes nacionais entre inversores, placas solares, estrutura e materiais elétricos. Apesar do crescimento do mercado, boa parte dos equipamentos ainda são importados, dificultando o financiamento de bancos públicos que exigem um percentual mínimo de nacionalização. Como alternativa, vêm ampliando as linhas em bancos privados e cooperativas de crédito, como o Sicredi.

– O mercado tende a dar um salto a partir de agora, com a maior disponibilidade de crédito e mais fabricantes – aposta Domingos Velho Lopes, produtor e conselheiro da Farsul que está medindo os índices solares na propriedade em Mostardas para concretizar o investimento.

Detalhe
– Desde 2012, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) passou a permitir que os consumidores gerem e consumam a própria energia elétrica.

– Para abastecer com energia fotovoltaica uma residência onde vivem quatro pessoas, o investimento médio varia de R$ 15 mil a R$ 25 mil.

– O sistema pode reduzir de 80% a 90% a conta mensal de luz, tendo um retorno médio do valor investido em um período de seis a 12 anos.

– A durabilidade dos módulos fotovoltaicos é de, no mínimo, 25 anos, com garantia de fábrica.

 

GLAUCO DINIZ DUARTE  Agricultura
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